quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

Fragmentos 3


Carlos U Pozzobon — Ainda Sobre o Estado

O mito das esquerdas pervade a atmosfera do Estado na pressuposição de que a sociedade de classes gera um estado de classes e de que o Estado Burguês (as maiúsculas são da esquerda) se diferencia do Estado Proletário radicalmente: o velho mito de que o Estado serve a interesses de classe, encobre sua função mais fundamental: a de organizar uma burocracia cuja função é criar Poder para seus grupos dominantes INTERNAMENTE, com distinções e privilégios que lhe tornam idênticos à revelia de qualquer ideologia que lhe justifique. E talvez seja a ideologia não mais do que uma máscara do poder.

A opressão do estado se dá na exata medida da imobilização da sociedade. Impossibilitada de tomar medidas por sua própria espontaneidade, ela pede ao Estado que assuma a função que sua própria coerção (direta ou indiretamente) coibiu. O resultado é o aumento da burocracia em regime sem transparência da degradação.

O Estado só é eficiente quando o povo o odeia, quando as instituições lhe criticam impiedosamente, quando ser admitido e demitido é moeda corrente.

A piedade é um sentimento quase sempre equivocado. Funciona como uma transferência de nós mesmos para a desgraça alheia quando nos pomos na pela do desgraçado. Ocorre que esta projeção tem equívocos impensáveis desde que a causa da desgraça alheia possa ser resultado de atitudes morais que jamais tomaríamos.

Macedonio – Museu de la Novela de la eterna, pg. 31: “A finalidade da Arte é o fim da vida, do individual dela”.

24/6/87
Somente as religiões evangélicas podem imobilizar na quietude. A imobilização do catolicismo rendeu o barroco, extraordinária criação do espírito intelectual especulativo, em oposição à Reforma que liberou todas as energias humanas para a ação, no lugar da especulação intelectual.

O poder significa interdependência: uma alienação do eu em crédito ao outro. Não se constrói poder sem se agradar aos outros.

Nacos:
Pícnico – na tipologia de Kretschner, diz-se do tipo corporal de formas arredondadas, baixo e reforçado, membros relativamente curtos, correspondente ao caráter ciclotímico.

A imobilização é derivada de alguns fatores, que são:
a) perda do poder de decisão.
b) falta de oportunidades na sociedade que possam canalizar toda a energia social em função da realização das potencialidades humanas e da satisfação das aptidões. A literatura está forrada de personagens num grau reprimido (ou aqueles que vivem na ignorância apresentam sempre uma tendência à aberração e ao grotesco).

Nosso carnavalismo não é só uma confissão de insatisfeitos; é também a irridência como vingança (como forma mais alta de crítica) da obtusidade que nos oprime, da incivilização que vivemos. É uma forma de mostrar a distância que nos separa daquilo que idealizamos ou daquilo que observamos nos países desenvolvidos). O homem irridente é um homem revoltado; o riso (não a ironia, mas a escrachinação) é uma vingança que usa a violência da expressão contra a violência física.

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O Poder da festa é liberar uma repressão que está no instinto e não no intelecto; é dar vazão a um descontentamento desconhecido, que não se sabe ao todo e que é difuso como a fantasia que representa.

Para uma doublespeaak:
alimentar o ego = ir direto ao assunto, contornar obstáculos
rudeza = falar francamente
impropriedade = falar assunto em pauta
imprudência = exigir comprimento do dever
insensibilidade = chamar atenção do erro.

O servilismo surge da subordinação, da necessidade de se admirar a mediocridade que nos comanda. Boa parte do lixo cultural importado do exterior serve como exemplo da pressão do consumo industrial de cultura perfeitamente orquestrada pelos organismos servis.

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Houve um período de equilíbrio dentro da desordem, seguido por um período de desequilíbrio dentro da ordem. Aliás, para que haja equilíbrio é necessário uma certa desordem, como condição de disputa social, caso contrário ela se arrebenta numa “ordem” falsificada. É o que se verifica no pré-64. Naquele época de angústias e incertezas, as famílias costumavam dar grandes festas, os vizinhos tinham relações entre si, a vida social era baseada na tolerância, na cortesia, na espontaneidade e na necessidade de estar-se bem relacionado. Com o golpe as coisas se invertem, a sociedade se divide não mais entre opiniões políticas divergentes apenas mas entre perseguidos e beneficiados. A espontaneidade se esvai em silêncio, a cortesia se transforma em hipocrisia, o estatismo na tirania tributária, a exploração violenta liquida com a tolerância e provoca a ansiedade. O Brasil entra na Era Tecnológica, nesta Era em que as pessoas se evitam, em que a moralidade se desfaz e a farsa e o mau caráter são encorajados institucionalmente, quando as oportunidades desaparecem para as novas gerações, e a sociedade paralisa-se no ódio e ressentimento. Recolhido na falta de sociabilidade, o homem perde a docilidade e começa a dar vazão aos recalques.

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05/07/87
A imaginação fica a serviço da obrigação do Estado, do dever de servir os cidadãos, e não da colaboração recíproca, da criação de instituições de ação coletiva independentes.

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A literatura é o contrário da realidade. Quanto mais distante da realidade, maior o poder de sedução da imaginação literária. A horrível literatura de ação do 'potboiler' anglo-saxônico tem uma enorme massa de fãs e leitores: aqueles cujas vidas são consumidas na paralisia burocrática, na ausência total de individualidade, imaginação e interesse. São estes seres mesquinhos que consomem avidamente tudo o que lhes diz ao contrário, tudo o que lhes seduz pela aventura, autodeterminação, eficiência tecno-burocrática, gostos bem definidos e um saudável estilo de vida: isto é, tudo o que o leitor não tem, mas que deseja.

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Numa ditadura como a nossa, num descalabro de sórdidas extirpações da cultura nacional, a perda da tranquilidade é a mais odiosa e inelutável das derrotas. O intranquilo sem critérios vive a penitente obrigação da decadência: a incapacidade de romper o silêncio por excesso de ruído odioso reprimido. A realidade não é exterior a ele, mas vive no seu íntimo retorcendo sua incapacidade de corromper-se.

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É claro que se gerações inteiras são impedidas de desenvolverem suas potencialidades, deve haver um ressentimento reinante nestas frustrações: como o ressentimento é a troca do bom pelo mau, do útil pelo inútil, do certo pelo errado, ele é um agente da confusão de identidade e por isso do mascaramento carnavalesco.

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14/7/87
― O Ministro Fulano de Tal é um homem generoso ― disse o observador dos fatos factuais.
― Então deve ser um ladrão ― respondeu o outro, treinado na arte dos Desfiles das Escolas de Samba.
― Mas como chegastes a esta conclusão? ― interrogou o primeiro.
― Muito simples, meu amigo, muito simples. Para que haja corrupção se faz necessário um alto grau de cordialidade. Mas a cordialidade só passa a generosidade quando o roubo for quantitativamente grande e significativo, onde as obrigações distributivas forçam a institucionalização transgressora a formarem alianças. Um ladrão não é generoso pelo caráter, porém pela imposição do ofício. Só se pode ser corrupto com sucesso sabendo repartir o butim. O egoísmo é a perdição do ladrão do alto bordo governamental.

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A inflação era tão galopante, que a passou a ser a jato, e no país do ditador, ao subir num táxi, percebeu que o aumento da tarifa no taxímetro era muito menor que o alucinante aumento diário da inflação, razão pela qual dedicou-se a fazer um passeio pela cidade, sabendo que quanto mais se demorasse, ao fim mais barato sairia a corrida.

15/7/87
Vuelta 126, pg, 32
“Se questiona sobre a escravidão voluntária, cujo sinal mais notório se encontra na submissão amorosa ao príncipe, no arrebato que ao mesmo tempo que despoja os homens do sentido de sua identidade própria, os ata ao corpo imaginário de um amo como se fosse seus membros. Se pergunta a acerca da atração que exerce o UNO”.

Não é aqui que ocorre um transformação da linguagem? Uma compressão? Uma deformação carnavalizadora baseada no agradar-se mutuamente?

Nacos:
Esmulanbando ― abruptalmente

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A psicanálise social é a demonoanálise, seguindo os conceitos de Rollo May, e a democracia a demonocracia.

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Num período de decadência desaparece a possibilidade das pessoas resolverem a seguinte pergunta: quem sou eu? Que quero do mundo? Quais são as minhas aspirações? Com o ego ocultado pela ausência de oportunidades, pela vida em constante dívida com o Eu, o inconsciente não faz mais do que criar máscaras, infinitas vestimentas da personalidade desestruturada. A arrogância é um sintoma da decadência.

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Os licitadores e os fornecedores da casa real, ambos falácias do liberalismo. Gente sem princípios, convivas da ditadura travestidas em críticos do estado: conservadores de teorias emprestadas com alta dívida de princípios.

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Sobre a esquerda no Sorriso dos Governantes:
O mito de estado repousa nas esquerdas na impossibilidade de imaginar a organização social sem o desejo subjetivo da orientação, do guia que pode conduzir os assuntos com precisão e eficiência. Da mesma forma que o obsessivo não pode supor que as ações humanas possam prescindir das suas opiniões e de si mesmo, que as coisas se arranjam por si próprias, o esquerdista não pode achar que a sociedade possa se reorganizar sem a tutela ordenadora do Estado. E como não existe religião sem Igreja, o mito do estado é o evangelho das ideologias decantadas na crendice e cretinice de achar que “os escolhidos” podem orquestrar harmonicamente a sociedade. Esta enfermidade voluntarista, este espírito jesuítico cujo sofrimento social se volta para a divinização homogênea das utopias, demonstra, sobretudo, como os homens podem privar-se do dionisíaco de si mesmos em função de uma crença inesgotável no objeto da adoração: o mito do estado eficiente.
Esquecer que o Estado só pode atingir um nível de eficiência onde a tradição política e jurídica é altamente contrária a ele, é o pecado capital da esquerda, e uma confusão terrível de discernimento histórico.

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Nossa versão do fascismo é o liberalismo de Estado, esta grande família de políticos, intelectuais, homens de letras, gente de cargos associados para a defesa do prestígio de instituições apodrecidas, que sobrevivem da reciprocidade das louvações, da agradabilidade mútua e da inexistência de conceitos definidos e nem mesmo da honra mínima de desligar-se de uma instituição quando esta não serve os objetivos éticos pressupostos. Na esteira dos pavoneados da cultura nacional, os prisioneiros do estado prestam-se os mútuos favores do exibicionismo social, elogiando-se, condescendendo-se uns aos outros em proclamas e citações que nos fazem um país cada vez menor e insignificante.

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Como sair fora do cipoal de dissimulações quando a identidade pessoal foi perdida?, quando não se tem um sistema de orientação no mundo?, quando somos invadidos culturalmente?

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O grande energúmeno mistura dois ingredientes letais na deformação da personalidade: a onipotência com o ressentimento.
A sólida certeza de conceitos cuja verdade não pode ser discutida, transportado pela negação e desprezo com o que lhe cerca, conduzem à iconoclastia ridícula, a sustentação de pontos de vista baseados na insolência e na provocação. O energúmeno, de iconoclasta passa a destruidor e (por ter um arraigado instinto de pureza e excepcionalidade) vive para seu narcisismo alternado com fases de remorso e autoindulgência.


Mikhail Baktin – Rabelais and His World

Pg. 7: Por causa do seu óbvio caráter sensual e seu forte elemento de peça, as imagens carnavalescas estreitamente parecem-se com certas formas artísticas, notadamente o espetáculo. Por seu turno, os espetáculos medievais tendem frequentemente para a cultura folclórica, a cultura do mercado público, em certa extensão torna-se um de seus componentes. Mas o núcleo básico do carnaval não é de forma alguma uma forma artística pura nem um espetáculo, e falando em termos genéricos, não pertence à esfera da arte. Pertence a linha divisória entre a arte e a vida. Em realidade, é a vida mesma, mas moldada de acordo com certos elementos de peça.

Pg. 13: Celebrações do tipo carnavalesco representam uma parte considerável da vida do homem medieval... As grandes cidades medievais devotavam uma média de 3 meses por ano a estas festividades. A influência do espírito carnavalesco era irresistível: ele fazia um homem renunciar a seus status oficial como monge, clérigo, scholar e perceber o mundo no seu aspecto risonho.

....A paródia latina ou semiparódia era espalhada por todos os lados. O número de manuscritos que pertencem a essa categoria é imenso. A ideologia oficial e ritual inteira é aqui mostrada em seus aspectos cômicos. O riso penetrava nas mais altas formas de culto religioso e pensamento.

Pg. 66; A concepção renascentista do riso pode ser grosseiramente descrita como segue: o riso tem um profundo significado filosófico, é uma das formas essenciais da verdade, considerando o mundo como um conjunto relativamente à história e ao homem; é um ponto de vista peculiar relativo ao mundo, o mundo é visto renovado, não menos (e talvez mais) profundamente que quando visto por um ponto de vista sério. Por isso, o riso é tão admissível na grande literatura, colocando os problemas universais, como a seriedade. Certos aspectos essenciais do mundo só são vistos através do riso.

Pg. 67: O riso é um divertimento leve, uma forma salutar de punição social das pessoas corruptas e baixas.

Pg. 68: Fórmula de Aristóteles: “de todas as criaturas vivas, somente o homem é dotado do riso”. De acordo com Aristóteles uma criança nunca começa a rir antes dos 40 dias depois do nascimento. Somente a partir desse momento ela se transforma em ser humano.

Pg. 70: O riso como cura e regeneração e também como ‘regulador da vida’, segundo Montaigne.

Pg. 71: De um papiro alquimista egípcio do 3º século preservado em Leiden, a criação do mundo é atribuída a uma divina risada. “Quando Deus riu, 7 deuses nasceram para dirigir o mundo. Quando ele desatou a rir pela primeira vez, veio a luz.... quando ele desatou a rir pela segunda vez, nasceram as águas, na sétima gargalhada, a alma apareceu....

Pg. 73: O riso medieval tornou-se na renascença a expressão de uma nova e livre consciência histórica crítica.

Pg. 92: O riso na história da cultura expresso por Herzen.
“O riso contém algo revolucionário... O riso de Voltaire era mais destrutivo que as lágrimas de Rosseau..... Rir não é assunto para brincadeiras e não podemos abandonar nosso direito de fazê-lo. No mundo antigo, o público rugia as gargalhadas no Olimpo e sobre a terra enquanto escutava Aristófanes e suas comédias, e rugia as gargalhadas com Luciano. A humanidade cessou de rir no século quarto em diante; ela não fez mais do que chorar. Assim que a febre do fanatismo baixou, os homens começaram a rir outra vez. Seria extremamente interessante escrever a história do riso. Na Igreja, no palácio, na parada, na direção do departamento, no gabinete da polícia, o administrador germânico, ninguém ri. Os servos eram proibidos de sorrirem na presença dos seus patrões. Somente se ri entre iguais. Se os inferiores fossem permitidos de rir na frente dos seus superiores, e se eles não pudessem suprimir suas hilaridades, isto seria o adeus ao respeito.

Pg. 95: Assim, a desconfiança dos tons sérios e a confiança na verdade do riso tem um caráter espontâneo e elementar. Se entendia que o medo nunca se movia furtivamente ao lado do riso (que não construía cadafalsos) e que a hipocrisia e mentiras nunca riem, mas usam uma máscara séria. O riso não cria dogmas e não pode tornar-se autoritário, ele não conleva o medo, mas o sentimento de força. Está ligado ao ato de procriação, movimento, renovação, fertilidade, abundância. O riso está relacionado com alimentos e bebidas e a imortalidade terrestre do povo, e finalmente, relacionando com o futuro das coisas que virão, que era um caminho (direção) clara para eles. A seriedade era entretanto elementarmente desconfiativa, enquanto a verdade estava no lugar do riso festivo.

Pg. 151: No mundo da literatura e especialmente na tradição oral anônima, encontramos exemplos da inter-relação dos tronos da morte e o ato de defecar... Sêneca em seu Ludus morte Claudii, o imperador morre no momento da defecação. Os habitantes da ‘Ilha do Vento’ em Rabelais, morrem emitindo gases e suas almas deixam o corpo pela via do reto. Em outra passagem, Rabelais cita o exemplo do Romano que morreu porque emitiu um certo som na presença do imperador.

Pg. 175. O excremento é um assunto alegre nas antigas imagens escatológicas, ele está ligado a geração de força e fertilidade. Por outro lado, o excremento é concebido como algo intermediário entre o corpo e a terra, algo relacionado entre um e outro. É o intermediário entre o corpo vivo e a morte desintegrando a matéria que é transformada em terra, em natureza.

Pg. 178: Rabelais e seus contemporâneos não tinham medo do humor em suas interpretações da história; eles temiam somente a estreiteza petrificada da seriedade.

Pg. 281: O encontro do homem com o mundo que toma lugar dentro da aberta, mordedora, rasgada, mastigadora boca, é um dos mais antigos e mais importantes objetos do pensamento e imaginação humanos. Aqui o homem degusta o mundo, introduz o mundo em seu corpo, torna-o parte de si mesmo.

Nos mais antigos sistemas de imagens, o alimento está relacionado com o trabalho. Ele concluía o trabalho e sua luta e era sua coroa de glória... O trabalho triunfava no alimento, no engolir daquilo que tinha sido arrancado do mundo. A tristeza e alimentos são incompatíveis (enquanto a morte e o alimento são perfeitamente compatíveis), ao passo que o banquete triunfal sempre celebra a vitória ou triunfo sobre a morte.

Pg. 286: A verdade franca só pode ser dita na atmosfera do banquete. O Pão e o Vinho dispensam o medo e liberam a verdade. A oposição vinho – azeite, azeite seriedade, beatice, carolice e o medo de Deus. O vinho libera da pieguice e do medo, In vino veritas.

Pg. 380: É um jogo alegre e livre com objetos e conceitos, mas é um jogo que possui um objetivo distante e profético: expelir a atmosfera de melancolia e falsa seriedade envolvendo o mundo e seus fenômenos, para emprestá-lo uma visão diferente, para torná-lo mais material, perto do homem e seu corpo, mais inteligível e leve no sentido do corpo. Palavras e gestos são gradualmente liberados da piedosa seriedade dos tons de súplica, lamento, humildade e piedade, assim como das intimidações, ameaças e proibições.

Pg. 393: Carnaval vem do germânico KARNE ou HARTH, que significa lugar sagrado, isto é, uma comunidade pagã e seus pregadores, e de VAL ou WAL, que significa morto. De acordo com essa teoria carnaval significa, a ‘procissão dos deuses mortos’ (divindades depostas). A ideia de um cosmos estratificado dividido entre mundos altos e baixos foi tomada do neoplatonismo. O cristianismo tomou a ideia da redenção como uma intermediação entre esses 2 níveis. O modelo visível e concreto da terra no pensamento medieval era sempre vertical.

Pg. 410: O não ser dos objetos, sua negação, é sua outra face, seu interior. E esse interior ou estrato inferior, adquire um elemento de tempo; ele pode ser concebido no passado como o obsoleto, ou o não existente. O Objeto que foi destruído permanece no mundo mas numa nova forma de ser no tempo e espaço; ele torna-se o ‘outro lado ‘ do novo objeto que toma lugar.

A negação na fantasia popular-festiva nunca tem um caráter abstrato lógico. É sempre uma coisa óbvia, tangível. Aquilo que fica atrás da negação não é o nada, mas o ‘outro lado’ daquilo que é negado, o carnavalesco às avessas.

A negação reconstrói a imagem do objeto e primeiro de tudo modifica sua posição topográfica no espaço do objeto como um conjunto, assim como suas partes. Ela transfere o objeto ao submundo, substitui o de cima pelo de baixo, a frente pelas costas, precisamente exagerando alguns tratamentos à expensas de outros. A negação e destruição dos objetos é por isso seu deslocamento e substituição no espaço.

Nota ao pé da página: Até hoje, somente os fenômenos expressando as relações da lógica formal foram analisadas, ou melhor, somente aqueles que combinam a estrutura dessas relações: manifestações num plano simples, numa dimensão, e num tom, representando a característica estática de um objeto, não o seu devir e ambivalência.

Continuação:
O carnaval celebra a destruição do velho e o nascimento do novo mundo – o ano novo, a nova primavera, o novo reinado.

O velho mundo que foi destruído é oferecido junto e representa a parte morrendo junto com a nova do corpo dual. Homens travestidos de mulheres e vice-versa.
Objetos domésticos são transformados em braços, tornados ao avesso, utilizados na forma errada, utensílios de cozinha transformam-se em instrumentos musicais. A fantasia do tempo e espaço é também marcada pelo elemento da negação em abuso.... O abuso é a mais antiga forma de fantasia ambivalente negativa.


Lei polissilábica do riso: Aristófanes em Os Pássaros descreve a cidade imaginária como Nephelococygia.

Meu: VIDENTE
Todo superdotado é um péssimo vidente. Aqueles que preveem o futuro nada mais fazem do que se equivocar. A baixa inteligência é capaz de muito mais adivinhações do que a alta. Todo profeta é um sub-dotado. Huxley, que tinha fama de ser superdotado é demasiadamente tedioso quando descreve os ruídos de suas máquinas infernais no ano 600 d. Ford. Jogando na frente, Huxley imaginou uma parafernália de relés e equipamentos eletromecânicos operando. Errou pelo princípio: não foi capaz de imaginar o computador, a sucessora da comutação eletromecânica, e uma máquina silenciosa que estava sendo desenvolvida nos seus bigodes.

Arúspice – sacerdote romano que advinha o futuro mediante o exame das entranhas da vítima.


Casuísmo x tradição: O problema do casuísmo é a confusão causada por uma cultura que despreza a tradição, ou melhor: o casuísmo são amputações na tradição para forçar outra cultura.


O que nos faz rir é a convicção dos outros, não suas piadas. Estamos num mundo de tantos energúmenos ilustrados que a maturidade intelectual é o maior patrimônio humorístico possível.


Do livro Cantar dos Trovadores, pg. 123: João Garcia de Guilhade, é, no enquadramento dos desmaiados amores trovadorescos, uma hipérbole libertina, uma voz bocagiana destoando genialmente na catedral dos amores góticos.

Deixa estar jacaré que a maré há de secar.


Não é apenas deplorável que a sociedade atual tenha criado indivíduos com total ausência de virtudes: o que choca é que ela ao mesmo tempo dá nascimento ao medíocre hedonista-farsante, espécie biológica sub-humana da sociedade de consumo.


Não só a arte e a cultura na sociedade industrial são residuais: a universidade também. Investir contra a insensibilidade da crítica literária como faz Gore Vidal é não compreender que numa sociedade de massas qualquer assunto está coberto de energúmenos ilustrados.

Macedônio Fernandez — No Toda es Vigília la de los Ojos Abiertos

Pg. 190: A metafísica é o retorno à Visão Pura, ou seja, ao estado místico. Estado místico é viver sem noção de começo de si mesmo, sem noção de cessação, sem noção de história individual, sem noção de identidade pessoal, sem noção de identidade e reconhecimento do cosmos, sem noção de unidade do cosmos, sem noção de unidade da pessoa, sem rumo de marcha nem perfil de unidade, sem noção de subordinação a um criador. Estado místico é viver como auto-existente incriado; e creio também que é viver sem a discriminação imagem-sensação, sonho-realidade, e sem a discriminação novo-recordado, novo-já-conhecido. Por isso tudo, estado místico é viver sem motivo nenhum de ação.

Este blog contém mais citações da Obra de Macedonio. Busque pelo nome.


Érico Veríssimo — A Volta do Gato Preto

Pg. 16: “cresci com esse medo na alma (da polícia) e com a subterrânea ideia de que o funcionalismo público é uma organização destinada especialmente a dificultar as coisas, e de que no fim de contas o governo não passa mesmo de um instrumento de opressão.”

Pg. 218: sobre os ditadores

Pg. 256: sobre o caráter dos americanos e a guerra.

Pg. 269: “Chovem perguntas. Em sua maioria são tolas: perguntas de gente feliz.”

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Dante Milano – Filmagem do carnaval noturno:
“ o tampo rotundo do bumbo retumba, cuícas catucando um batecum macambúzio de macumba”.
Gabirus e sirigaitas.

Pio Caro Baroja, El Carnaval, pg. 81: “o galo é com efeito, uma espécie de símbolo da vida, o expulsar da morte; dos espíritos malignos, diabos, bruxas, etc, no folclore indo-germânico em geral”.

J.M.Taylor: A cultura urbana afro-brasileira deu origem ao samba que mais do que um ritmo, é também uma coreografia e uma dança e motivo de encontros sociais.
Assim como na Idade Média o carnaval não era só na véspera da quaresma, também no Brasil o carnaval está associado com o futebol, com os resultados dos campeonatos regionais, nacional e internacional. As competições entre ranchos começaram em 1935.
Um grande bicheiro pode fornecer importância significativa de dinheiro para a Escola de Samba e com isso ganhar a proteção da lei em troca dos votos que a Escola de Samba dá ao político.

Artistas trabalham incessantemente na decoração das ruas centrais das grandes cidades nos dias anteriores aos desfiles.
Para o habitante das favelas do Rio, a única maneira de estar socialmente integrado, a única forma de conseguir um dentista, um médico e outros ‘privilégios’ da favela, é ser um bom sambista. Isso não impede que o profissionalismo no Carnaval tenha descaracterizado sua tradição em favor de uma super-alegoria faustuosa de clubes ricos que organizam o carnaval como uma empresa. Por isso é comum encontrar-se hoje certos cordões e blocos muito mais autênticos que grandes Escolas.
As Escolas todavia possuem suas própria facções e muitas vezes lutam entre si para indicar ou aceitar um artista ou por qualquer decisão externa.

Leituras:
The turn of the Screw – Henry James
Daisy Millher – Henry James - Ambos em dez/83
1984 – George Orwell
Pauliceia Desavairada – Enfibraturas do Ipiranga ; Mario de Andrade (20/1)
Papeles de Recienvenido – No toda es vigília La de los ojos abiertos : Macedonio Fernandez
Comedias e Sonetos – Shakespeare – 18/01
The Suicide Club - Setevenson – 3/2
Antologia de Poesia Bras – Antonio C. Machado – 6/2
Carnaval, Malandros e Heróis – Da Matta – 10/2
A Volta do Gato Preto : E. Verissimo – 13/02
El Carnaval – Pio Baroja – 16/2
Antologia do Carnaval : 19/2
Gato Preto em campo de neve : E. Verissimo – 22/2


Lima Barreto — Recordações do Escrivão Isaías Caminha

Pg. 68: “Gregorovich incitara-me a trabalhar pela grandeza do Brasil; fez-me notar que era preciso difundir na consciência coletiva um ideal de força, vigor, de violência mesmo, destinado a corrigir a doçura nativa de todos nós”.

“Ao som de um tímpano rouco, arrepanhando a batina”.

Sobre o jornalismo: pgs 103-109.

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Meu: Um monocorde grito de um bislouco tresvariando de quatro como um quinta coluna rodopiando sextavado em decúbito polimórfico.


Lezama Lima — Fragmentos a su Iman

Prólogo de José Agustín Goytisolo: “o termo barroco só é admissível para qualificar sua obra se se derivar de suas origens, isto é, da voz portuguesa barroco, em castelhano barrueco ou berrueco, todas de raiz ibérica pré-romana, presumivelmente vasca ou celta, passada pelo mozárabe, e daí aos lusitanos, palavra que significa 'pérola irregular ou nódulo brilhante que costuma se encontrar solitária em certas rochas, especialmente graníticas’. Digo que neste seu verdadeiro sentido é admissível falar de barroco em Lezama, e acrescento que ainda remodelável, e ainda por duas razões. A primeira porque o francês toma o nome barroco português, a pérola ou joia feita por pérolas belíssimas ainda que irregulares; o adjetivo baroque para referir-se a um estilo artístico ornamental, e daí passa ao italiano barocco e ao castelhano barroco, tudo isso no século XVII, ainda que a arte barroca, em arquitetura, começa seu nome no final do século XVI... Outro sentido da palavra barroco, que tenta derivá-la do nome de um dos Quatro Modos da Segunda Figura, empregado pelos escolásticos para memorizar os silogismos (Cesare, Comestres, Festino e Baroco...) é besteira e especulação vã, própria de Croce e de outros historiadores e teóricos da Arte que se perderam nos ramos da árvore hegeliana e que fazia rir Lezama, possivelmente mais por diversão que por mofa, já que sabia que nessa acepção silogística, o qualificativo barroco não lhe era aplicável”.

Scintilla animae – a centelha da inteligência era a crença medieval do estado primordial das imagens ou arquétipos.

Maximas Maliciosas Bobaliconas:
Engels: “É uma desgraça que a maravilhosa California tenha sido arrancada dos preguiçosos mexicanos que não sabiam o que fazer com ela?“
Marx sobre o hinduísmo: “É um culto bestial da natureza, cuja degradação se manifesta no fato de que o homem, o soberano da natureza, cai de joelhos para adorar a Hanuman, o macaco, e a Sabbala, a vaca”.


James Fraser — The Golden Bough

Pg. 64: “Se nos mais atrasados estados da sociedade humana conhecidos encontramos a mágica visivelmente presente e a religião visivelmente ausente, não podemos por isso conjeturar que as civilizadas raças do mundo têm no mesmo período de suas histórias passado através de uma fase intelectual similar, que ela tenta forçar os grandes poderes da natureza aos seus prazeres numa escala tal que justo no lado material da cultura humana houve sempre uma Idade da Pedra, como no lado intelectual tem havido sempre uma Idade da Magia?”

“Mas esse profundo senso de religião, essa mais perfeita submissão à divina vontade em todas as coisas afeta somente aquelas altas inteligências que tem uma largueza de visão para compreender a vastidão do universo e pequenez do homem. Pequenas consciências não podem abraças grandes ideias”.


Ocatvio Paz — Sor Juana Ines de la Cruz o las Trampas de la Fe – 1982 – Seix Barral.

Fragmentos 5 contém as anotações esparsas deste livro, enquanto que no meu ensaio comparativo entre Juana Inês e Gregório de Matos traço mais considerações sobre o livro.

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Sobre a ciência (4/5/84) – O desenvolvimento da ciência requer diferentes graus de subjetividade. Daí porque o desenvolvimento dos Estados Unidos tenha sido tão avassalador. Os americanos criaram as condições para o desenvolvimento da ciência, empregando cientistas de todas as procedências. E são as culturas mundiais que garantem a diversidade da subjetividade.

O sentimento de não se pertencer a uma comunidade, à espécie humana, é o mais claro sinal da vocação artística.

Ungaretti: Vita d’um Uomo – pg. 52:
Sono come
La misera barca
e l’oceano libidinoso

ANALECTOS – Coleção de aforismos ou ditos célebres.
É muito certo que se deve respeitar a opinião alheia: mas só depois da última gargalhada. Quantas vezes uma conversação em um bar é mais profunda do que a exposição em uma cátedra universitária?

Em vez de nos mandarem Harvard, a Broadway ou os grupos de jazz, mandaram os Mórmons e o Exército da Salvação. E depois falam do nosso subdesenvolvimento com indulgência.


Giambattista Vico — Scienza Nuova – The New Science – Thomas G. Bergin e Max H. Fisch – Cornell Univesity Press 1968:

Imagem mitológica operacional: o leão de Hércules vomitando fogo.
Luci – lavouras queimadas

Pg. 13: A mente deve comandar o corpo e não servi-lo. Por isso, a divina providência ordenou as instituições humanas com a eterna ordem: que, nas Repúblicas, aqueles que usam suas mentes devem comandar, e aqueles que usam seus corpos devem obedecer.

Pg. 30: Alexandria foi fundada por Alexandre o Grande, unindo a agudeza africana com a delicadeza grega e produzindo distinguidos filósofos na Antiguidade, sendo também um grande emporium do mediterrâneo.

Pg. 39: Os feudos originaram as leis que cresceram depois entre as nações antigas e modernas.

Pg. 71: O prodígio é filho da ignorância; e quanto maior o objeto do prodígio, mais a ignorância cresce.

P. 71: O mais sublime trabalho de poesia é dar senso e paixão à coisas insensatas; e é característica infantil ela tomar coisas inanimadas em suas mãos e falar com elas brincando como se fossem coisas vivas.
Este axioma nos prova que no mundo infantil os homens são por natureza sublime poetas.

Pg. 72: As religiões falsas não nasceram da impostura, mas da credulidade.

Pg. 72: PRIMOS IN ORBE DEOS FECIT TIMOR
O medo criou primeiro os deuses no mundo (Estacio,Tebaida, livro III, 661) O começo do heroísmo entre os povos está relacionado com a falsa opinião de que os heróis nasceram de origem divina; e Varro que foi o mais estudioso dos antigos contou 40 diferentes Hércules na Antiguidade.

Pgs. 74-75: diversiloquia: expressão compreendendo um conceito genérico várias espécies de homens, façanhas ou realizações, e coisas.

“Quem não é poeta por natureza, não pode tornar-se por arte”.

As palavras são portadas por corpos e pelas propriedades dos corpos para significarem as instituições da mente e do espírito.

Pg. 78: A origem da palavra Lex é ler como derivado de coleção de letras, um feixe delas para cada palavra foi chamado legere.

Pg. 78: Os homens primeiro sentem necessidades, depois procuram utilidade, após buscam conforto, pouco mais tarde agradam-se a si mesmos com prazeres, então crescem para a dissolução e a luxúria, e finalmente vão à loucura e desperdício de suas substâncias. A natureza das pessoas é primeiro crua, depois severa, então benigna, depois delicada e finalmente dissoluta.

Pg. 79: Na raça humana primeiro aparece o grotesco e o vasto, como as Ciclopes; depois o orgulho e o magnânimo, como Aquiles; depois o valoroso e justo, como Aristides e Scipio Africano; perto de nós, impondo figuras de grandes aparências de virtude acompanhadas por grandes vícios, que entre o vulgo ganha o nome para a verdadeira gloria, como Alexandre e César. Pouco depois, a melancolia e reflexão, com Tibério; finalmente a dissolução e desavergonhada loucura como Calígula, Nero e Domiciano.
O sistema feudal como uma ‘ragione de benefizi’.
A honra é o mais nobre estímulo do valor militar.
Nápoles foi originariamente chamada de Sirena, uma palavra siríaca. Porque os sírios, isto é, fenícios, foram os primeiros a estabelecer uma colônia ali por propósitos comerciais. Depois foi chamada de Partenope, em grego heróico e finalmente Nápoles, em grego vulgar, provando como depois dos fenícios vieram os gregos por propósitos comerciais.

Lex dura est, sed scripta est – A lei é dura, mas assim foi escrita.
Lex dura est, sed certa est.

Pg. 94: A natural equidade do desenvolvimento total da razão humana é a prática da sabedoria nos assuntos de utilidade, pois que a sabedoria no seu sentido amplo não é mais que a ciência de fazer o uso dessas coisas como sua natureza dita.

Pg. 97: Bayle em seu Tratado sobre os Cometas (Pensée diverses, 1683) afirma que os povos podem viver em justiça sem a luz de Deus, referindo-se ao fato de que os índios brasileiros e de outras nações do Novo Mundo viviam em sociedade sem qualquer conhecimento de Deus.

Pg. 110: Nihil est in intellectu quim prius fuerit. Aristóteles sobre a Alma. Nada está no intelecto que não provenha dos sentidos.

Pg. 117: Poeta é a palavra grega para Criador.

Pg. 125: A origem da palavra lei, em latim ius, contração de ious (Zeus, Geová). Platão observa em Cratylus que os gregos primeiramente chamaram de diáion. Daí a latino subdio, que é também subiove e significa “no céu aberto”. Por eufonia diáion – dikaion.

Pg. 127: Favella significa faca e sua origem é fábula em latim e mythos em grego.

Pg. 130: A metonímia de um agente para ato resulta do fato que os nomes para agentes eram mais comuns que os nomes para os atos. A metonímia de uma assunto (subject) de forma ou acidente, foi devido a inabilidade de se abstrair formas e qualidades do assunto. Certamente a metonímia de causa para efeito produziu em cada caso uma pequena fábula, na qual a causa foi imaginada como uma mulher vestida com seus efeitos: Pobreza feia, triste Idade Antiga, polida Morte.

Pg. 131: A ironia certamente não deve ter começado antes do período de reflexão, porque ela é tachada de falsidade por força de reflexão, a qual usa uma máscara de verdade.

Pg. 137: diz que foram uma impostura os versos de ouro de Pitágoras, os oráculos de Zoroastro, o Poimander de Hermes Trimegisto, e os Órficos de Orfeu.

Pg. 139: Scandinavia era chamada de Vagina Gentium e acreditada ser a mãe das outras nações do mundo, pelos conceitos de Johannes e Hans Magnus, que eram da opinião que seus deuses preservaram desde o começo do mundo as letras divinamente inventadas por Adão.

Pg. 143: Na Alemanha a palavra escrita deve ter começado no tempo de Frederico da Suábia, ou ainda no tempo de Rodolfo Absburgo. ‘Não é interessante que a imprensa de Gutenberg seja invenção de uma escrita tardia’?

Pg. 147-148: Vico rebela-se contra o axioma da maior parte dos gramáticos que desconhecendo a origem dos vocábulos atribuem sua significação arbitrária, muito antes de Sausurre.

Pg. 150: As palavras humanas foram formadas de interjeições, que eram sons articulados sobre o ímpeto de violentas paixões.

Pg. 165: Os gregos eram acostumados a usar o superlativo pelo número três, como os franceses dizem trés por muito. Assim como Zeus portava raios que possuíam 3 estrias que se acreditavam transpassar o ar mais eficazmente. Assim também o tridente de Netuno era o gancho mais poderoso para cravar nos navios. Cerberus era chamado de 3 gargantas por ter uma enorme goela.
Não seria essa a origem do tri gaúcho, trilegal, sempre superlativo?

Pg. 166-167 – A familiaridade com as coisas deve preceder o julgamento delas. Os tópicos tem a função de fazer as mentes inventivas assim como a crítica as tem de fazer exatas.

Pg. 173: Nuptiae vem de nubendo que significa cobrir. E retornando aos tempos bárbaros, as solteiras eram chamadas de virgem in capillo, em distinção às mulheres casadas, que andavam com véus.

Pg. 183: Retornando agora do fogo à água, a Styx, pela qual os deuses juravam, era as fontes; assim esses deuses deveriam ser os nobres das cidades heroicas, já que a distribuição d’água deve ter dado a eles domínio sobre os plebeus. Por isso, no ano 309 de Roma os patrícios excluíram a plebe do conubium. A propósito disso, frequentemente lemos na Bíblia acerca do “poço do juramento” ou o “juramento do poço”. Assim, a cidade de Pozzuoli preserva no seu nome uma indicação de sua grande antiguidade, pois era chamada Puteoli no computo dos pequenos números de poços que ela reunia. E é uma conjetura razoável que muitas cidades com nomes plurais espalhadas nas antigas nações recebessem seus nomes diferentemente articulados daquilo que era em substância um e o mesmo (a união dos poços). Daí origina-se a terceira maior deidade, Diana, representando a primeira necessidade humana, água.

Pg. 196; O nome grego para amizade, philia, tem a mesma raiz de phileo, amor; e daí derivou do latim filius, filho. Philios em grego jônico significa amigo, e mutando para um som similar forneceu o grego phyle, tribo. Dessa natureza das instituições humanas permanece a propriedade natural de que a verdadeira amizade é o matrimônio, no qual se realizam os 3 bens finais: o honorável, o útil e o prazeroso. Marido e mulher por natureza compartilham as mesmas coisas em todas as prosperidades e adversidades da vida, assim como por escolha os amigos tem as mesmas coisas em comum (amicorum omnia sunt communia), e Modestius por isso define matrimônio como o compartilhamento vivido das coisas (ominis vital consortium).

Pg. 203: Honestas, tem o significado de nobilidade, beleza e virtude.

Pg. 221: Icologia: “Até hoje as coroas dos soberanos poderes são encimadas por uma esfera, onde está implantado o divino símbolo da cruz. A esfera é a maçã de ouro, significando o mais alto domínio que os poderes soberanos tem sobre a terra que eles são donos; e por essa razão é colocada na mão esquerda dos soberanos no meio dos ritos de coroação”.

Pg. 243: Tacitus em seu Vida dos Agrícolas, disse que os Bretões eram ferozes combatentes alcunhando a expressão DUM SINGULI PUGNANT, UNIVERSI VINCUNTUR, lutando separadamente, deixaram-se conquistar coletivamente.

Pg. 253: “Nulla altas virtutem feracitor”. Livio: Nunca houve uma época mais produtiva em virtudes.

Pg. 264: Memoria era o termo latino para phantasia ou imaginação. E nos tempos bárbaros passados fantasia era usada para engenho (ingegno), e o homem engenhoso ou inventivo era chamado de homem fantástico.

Pg. 265: Suas mentes eram tão limitadas a particularidades que eles viam cada mudança de expressão facial como uma nova face.... e para cada nova paixão eles imaginavam um novo coração, um novo seio, um novo espírito.... Eles fizeram do seio o lugar de todas as paixões. O irascível era o estômago, e o concupiscente era o fígado.

Pg. 272: As três divinas punições que somente os deuses podem infligir e não os homens, segundo Platão, eram: o perdão, a infâmia e o remorso da consciência culpada; e para se entender isso é possível pela via purgativa, onde se purga as paixões do espírito que atormentam a espécie humana (como ele interpretava o baixo mundo dos poetas) que se entrava através da via unitiva pela qual a mente humana consegue a união com Deus através da contemplação das coisas eternas e divinas.

Pg. 309: Havia uma lei ateniense exigindo que os personagens da Nova Comédia fossem de criação artificial, e os gregos desenvolveram com tanto sucesso que os latinos, com todo seu orgulho, declinaram de competir como informa Quintilhano no ditado: ‘cum graecis de comoedia non contedimus’, - nós não rivalizamos com a comédia grega.... A velha comédia tomou argumentos da vida real e fez peças dela tal qual era, como o perverso Aristófanes certa vez fez com o bom Sócrates, levando-o a ruína. Mas a tragédia colocou em cena ódios heroicos, desprezo, aversão e vingança, que brotaram da natureza sublime que naturalmente são as fontes dos sentimentos, modos de falar, e ações em geral que são selvagens, cruas e terríveis. Esses argumentos estão encobertos por um ar de maravilhoso e todas essas matérias estão em íntima conformidade entre elas e em seus temas.

Pg. 310: Daqui derivam 2 eternas propriedades da poesia: uma é que a sublimidade poética é inseparável da popularidade, e a outra é que os povos que primeiro criaram os personagens heroicos para si mesmos aprenderam depois os costumes humanos somente nos termos das personagens feito famosas por exemplos luminosos.

Pg. 332: A tradição diz que Homero era cego e que de sua cegueira tomou seu nome, o qual em dialeto jônico significa cego. Também se diz que por tradição ele era pobre e percorria os mercados da Grécia cantando seus próprios poemas.

Pg. 326: Na frase de Aristóteles de Plautus encontramos obtinere colorem no senso em que dizer uma mentira pode parecer uma verdade em alguns aspectos, como deve ser uma boa fábula. [Na nossa cultura dizemos “enfeitar o maracá”].

Pg. 331: A origem da sátira eram os festivais de colheita da uva, ou vindima. No cru e simples costume daqueles dias devem ter inventado a primeira máscara cobrindo os pés, pernas e coxas com a pela de cabra que tinham em mãos, e pintando os peitos e as faces com a borra do vinho, usando guampas e cornos na cabeça (talvez por isso nos nossos dias as vindimas são chamadas de cornuti). Nesse sentido deve ser verdade que Baco, deus da vindima, comandou Esquilo para compor tragédias. Tudo isso concorda com os tempos quando os heróis asseguravam que os plebeus eram monstros de 2 naturezas, meio homens, meio cabras. E a sátira sempre preservou a propriedade que lhe fez nascer: a de expressar invectiva e insulto, porque os camponeses, grosseiramente mascarados e dirigindo os carros no qual carregavam as uvas, tinham a licença de proferir os maiores abusos (Origem do Carnaval).

Interpretari veio de interpatrari, isto é, entrar nos pais.

Lucrécio: TANTUM RELIGIO POTUIT SUADERE MALORUM! Quantos males pode a religião trazer! Disse Lucrécio a propósito da morte de Ifigênia por Agamenon.

Bonitaria: propriedade natural, mantida por possessão física perpétua;
Quiritaria: propriedade que pode ser reivindicada;
Optimal: propriedade livre de qualquer incumbência pública ou privada;
Civil: que pertence às cidades;

Pg. 388: Paz vêm de pacio, que é o mesmo que pactum;

Pg 423: Quando os Estados populares tornaram-se corruptos, o mesmo aconteceu com as filosofias. Elas decaíram no ceticismo. Bobos educados começaram a caluniar a verdade.
[Excelente citação para os dias atuais, a respeito dos nossos dómines de ciências humanas].


Aristófanes, pag 101: Lei do riso polissilábico; Pisthetaerus!... Do you take me for a Lydian or a Phrygium and think to frigten me with your big words?


Herman Broch — The Sleepwalkers – Phanteon Books – 1964

Pg 292 — “When desires and aims meets and merge, whem dreams begin to foreshadow the great moments and crisis of life, the road narrows then into darken gorges, and the prophetic dream of death enshrouds the man who has hitherto walked dreaming in sleep: all that has been, all aims, all desires, flit past him once more as they do before the eyes of a dying man, and one can well-right call it chance if that road does not end in death”.

Pg. 296:
"O desejo de que alguém deve pagar o preço da morte pelo sacrifício e redimir o mundo para uma nova inocência: este sonho eterno da humanidade pode levar ao assassinato, este sonho eterno pode levar à clarividência. Todo o conhecimento oscila entre o sonho desejado e o sonho pressagiado, todo o conhecimento oscila entre o sacrifício da redenção e o Reino da Salvação.”


Bertrand Russell — In Praise of Idleness – Simon and Shuster – N. York 1972:

Os homens e as mulheres comuns, tendo a oportunidade de uma vida feliz, tornar-se-ão mais bondosos, menos atormentados e menos inclinados de ver os outros com suspeita. O gosto pela guerra morrerá, em parte por isso e em parte porque ela envolve um longo e severo trabalho para todos.

Pg. 188: Com a degradação moral e incompetência econômica, acompanha um senso instintivo de beleza que é uma recordação perpétua de Theocritus e o mito do Jardim das Hespérides.

Pg. 204: Aqueles que se sujeitam à autoridade transformam-se em submissos ou rebeldes, e cada atitude tem seus inconvenientes.

Pg. 207: As maneiras formais são mais desenvolvidas entre bárbaros e diminuem com cada avanço da cultura. Pesquisar sobre a saudação entre os nômades do Saara. Ortega Y Gasset – La Rebelión de Las Masas pg. 295.


Bertrand Russell — Authorithy and the Individual – Simon e Shuster, N. Y. 1949

Os Estados Unidos não são um país biológico, mas formado por imigrantes, isto é, nas palavras de Abraham Lincoln, ‘dedicado a uma proposição’.

A questão da coesão social como a propaganda inoculada pelo medo ao adversário.

Pg. 22: A verdadeira essência da virtude é dar prazer, e a do vício é dar dor. Humildade exalta, e orgulho mortifica. Beleza torna-se objeto de orgulho, e deformidade de humildade.

Pg. 27: “A decadência da arte em nossa época não é somente devida ao fato que a função social do artista não é tão importante como nos tempos antigos; ela é devida também ao fato que o deleite espontâneo não é mais sentido como alguma coisa importante de ser capaz de apreciar-se. Entre populações comparativamente não-sofisticadas, a música folclórica e as danças ainda florescem e alguma coisa de poeta existe em cada homem. Mas como os homens crescem mais industrializados e arregimentados, o tipo de prazer que é comum em crianças torna-se impossível para adultos, porque eles estão sempre pensando na próxima coisa, e não podem se deixar absorver por um momento. Este hábito de pensamento do ‘próximo momento’ é mais fatal para cada tipo de excelência estética que qualquer outro hábito da mente que pode ser imaginado, e a arte, em um sentido importante, para sobreviver, não poderá se basear na fundação de academias solenes, mas pela recaptura pela sociedade da capacidade de satisfação dos corações das alegrias e tristezas as quais a prudência e antevisão tenha tudo, menos destruído”.

“Na guerra moderna os cientistas são reconhecidos por todos os governos civilizados como os mais úteis aos cidadãos, provando que eles podem ser domados e induzidos a colocar seus serviços a disposição de um simples governo em lugar de toda a humanidade”.

Pg. 34: a relação que produz a maior paixão de orgulho é a propriedade.

Pg. 48: Sobre o autorrespeito: “O autorrespeito tem sido até agora, como necessidade, uma virtude da minoria. Onde quer que haja falta de igualdade no poder, não é improvável encontrar entre aqueles que estão sujeitos as regras dos outros. Um dos mais revoltantes comportamentos das tiranias é na forma como elas levam as vítimas da injustiça a praticarem adulação àqueles que as maltratam. Os gladiadores romanos saudavam os imperadores que estavam a ponto de sentenciar a matança da metade deles. Dostoievski e Bakunin, quando na prisão, fingiam pensar bem do Czar Nicolau. Aqueles que foram liquidados pelo governo soviético frequentemente faziam uma abjeta confissão de pecaminosidade, enquanto aqueles que escaparam dos expurgos indulgenciam-se em nauseantes adulações, e não infrequentemente incriminavam os companheiros. Um regime democrático é provavelmente capaz de evitar essas grosserias formadas pelo autorrebaixamento, e pode dar também oportunidade para a preservação do autorrespeito. Mas ele pode se aproximar do contrário”.

“Existe igualdade onde todos são escravos, assim como onde todos são livres. Isto mostra que a igualdade por si mesma não é suficiente para fazer uma boa sociedade”.

Pg. 68: É deplorável ver nos dias atuais na Rússia homens de ciência compelidos a subscrever a obscurantistas, non-senses mandados por políticos ignorantes da esfera daquilo que eles deviam supostamente ser competentes. Eles não podem pretender decidir o que é boa música, boa biologia ou boa filosofia.

The Praise of Idleness, pg. 97: Subsequentemente escritores com similar ponto de vista tem tentado provar que toda a excelência estava conectada com sua própria raça. Os professores irlandeses escreveram livros para provar que Homero era Irlandês; antropólogos franceses dão evidências arqueológicas que os celtas, não os teutônicos, foram a fonte da civilização no norte da Europa; Houston Chamberlain argumentava longamente que Dante era alemão e Cristo não era judeu. Ênfases na raça tem sido universal entre os anglo-indianos de quem a Inglaterra imperialista se infeccionou por meio de Rudiard Kipling.

Pg. 99: “Nenhum homem pensa sanamente quando sua autoestima sofreu um ferimento mortal, e aqueles que deliberadamente humilham uma nação tem somente que agradecer a si mesmos se ela tornou-se uma nação de lunáticos” (a propósito do racismo alemão).

A propósito de David Hume: A Teatrise of Human Nature – Everyman’s library, 1926:
Pg. 103: O pensamento de um objeto logo transporta a mente para o que é contíguo. Mas é somente na presença real de um objeto que a transporta com superior vivacidade.

Pg. 118: Não há filósofo que não reconheça a força da evidência moral: ela não é mais do que uma conclusão relativa às ações dos homens, derivada das considerações de seus motivos, têmpera e situação. Um príncipe que impõe uma taxa aos seus assuntos, espera a aceitação (compliance). Um general que conduz um exército, toma em consideração um certo grau de coragem [de seus soldados]. Um homem que dá ordens para seu jantar, espera obediência de seus serventes.

Pg. 123: é assim evidente que todas as leis humanas estão fundadas em prêmio e castigo, e se supõe que seja um princípio fundamental, e que estes motivos tem uma influência na mente e ambos produzem o bem e preveem as más ações.

Pg. 148-151: Hume trata de analisar o preconceito na forma de uma “regra geral” e se confunde por viver numa época muito anterior à psicologia. Questões psicológicas parecem ser empobrecidas quando tratadas apenas pela filosofia.

Pg. 159: Podemos comandar nossa mente até um certo grau. Além dele, perdemos todo o nosso império sobre ela.

Pg. 167: Definição de causa: “Um objeto precedente e contíguo com outro e onde todos os objetos parecendo-se com o anterior são colocados nas mesmas relações de precedência e contiguidade que aqueles objetos que se assemelham aos últimos, isto é: uma causa é um objeto precedente e contíguo a outro, e assim unidos com ele que a ideia de um determina à mente formar a ideia de outro, e a impressão de um formar uma ideia mais viva de outro”. [Pô, que chatice]

Pg. 173: Próximo ao ridículo de negar uma verdade evidente está o fato de sofrer muitas dores em defendê-la; e nenhuma verdade parece-me mais evidente do que a de que as bestas são dotadas de pensamento e razão tanto como os homens. Nesse caso, esse argumento é tão óbvio que nunca escapam ao mais estúpido dos ignorantes. [Deve existir a besta filosófica.]

Pg. 182: A razão céptica e dogmática são da mesma espécie, apesar de contrária em suas operações e tendências”.
Se o dogmático tem em sua razão uma poderosa força, o céptico continua acreditando em sua razão até que não pode mais defender sua razão pela razão.

Pg. 256: Em termos gerais, os erros em religião são perigosos, os erros em filosofia somente ridículos.

Pg. 257: Dois mil anos com longas interrupções e desencorajamentos são um pequeno espaço de tempo para dar alguma perfeição tolerável as ciências; e talvez estamos ainda numa idade tão prematura para descobrir quaisquer princípios que suportam o exame da última posteridade.


Carlos U Pozzobon — O Tempo Crematístico

[Meu]:O atraso brasileiro é também a herança depositada da contingência histórica ibérica. O orgulho pessoal, agindo como uma soberba que despreza a instituição sempre contaminou bubonicamente nossa história, e desgraçadamente não fez mais do que impedir nosso desenvolvimento. Se a história política dos outros povos ensinam algo, devemos aprender com a Inglaterra a lição mais elementar de política e história. A de um povo voltado para o louvor de suas instituições e história, mais que de suas figuras transitórias. A única forma de manter a continuidade é sem dúvida prestigiar o passado e fazê-lo algo presente e estímulo do porvir, que como diz Ortega “ao método revolucionário, a Inglaterra opôs o método da continuidade, o único que pode evitar na marcha das coisas humanas este aspecto patológico que faz da história uma luta ilustre e perene entre os paralíticos e os epiléticos”.

Desprezando as instituições e auto-louvando a si mesmos, nossos políticos portugalinos cristianizados pelo desejo absolutista de seus instintos caudilhescos, não fizeram nada mais do que amarrar a sociedade a sua ignorância de déspotas medíocres. E não podendo ser representantes do povo que desprezam, devem necessariamente ser subservientes aos amos que lhes fizeram cativos.

[Nota: eu insistia nessa época na ideia de que a burrice brasileira era devida a falta do poder de decisão, evidenciada pelos socorros financeiros internacionais, etc. Atualmente não defendo mais essa ideia, porque acho que a burrice brasileira é atávica; burrice no sentido de imaginação para o progresso coletivo, obviamente, não a burrice para se apropriar do patrimônio público.]

Se o passado e sua continuidade age como efeito nivelador de um povo, o mesmo não acontece com o medo do inimigo e também o desejo de rompimento com o passado. No primeiro caso, a ‘luta ideológica’ transforma-se num envenenamento diário, e numa corrupção do discurso tal que as ações do inimigo começam a serem imitadas com o pressuposto de evitá-las e a Nação se confunde com a Rival, perdendo sua herança histórica. É o caso dos Estados Unidos. No segundo caso, nada é capaz de ressuscitar o passado de uma forma tão viva do que as revoluções que desejam acabar com ele. E quanto mais se condena o pretérito, mais os novos governos ficam imersos nele, de tal sorte que parece que as velhas rivalidades e modelos sobrevivem através das lutas por extirpá-los. O stalinismo pelo czarismo é um ressuscitação grotesca da história, da mesma forma que a autodefesa israelense se parece com as perseguições nazistas. Essa brutalidade humana – que consiste em imitar o inimigo confundindo-se com ele – é sempre a princípio negada pela maior parte das consciências e depois, quando as circunstâncias não podem mais esconder, a verdade brutal é recebida com uma estupefação acomodativa. A história está cansada de ensinar que para haver progresso político é necessário revolução com tolerância, e vida intelectual colocada acima da material, assim como o pacifismo incondicional. Quanto mais nacionalista é um povo, mais dispostos estão a conquistar os frágeis alheios.

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ARTE/ARTESANATO: O pico máximo para o desenvolvimento artístico ocorre naquele povo que combina a habilidade manual com a profundidade intelectual. E no Ocidente, o intelectualismo nas artes passa sempre por uma razoável vida social de café ou bar, que sempre termina coletivamente expressando-se num ISMO de vanguarda, ou é o trabalho laborioso de um mago artífice solitário. O artesanato não exclui as artes, embora toleramos o amadorismo. Quando um povo tem muita ansiedade por ação e pouca pela crítica intelectual o artesanato se transforma em KITSCH. Quando a crítica intelectual é permeada pelo negativismo e o desdém, o artesanato também não floresce.


José Ortega y Gassey — Meditación del Quijote – Colecion Austral – Madrid – 1964

Pg. 14/15: “Pelo contrário, o amor nos liga as coisas, ainda que seja passageiramente. Pergunte-se o leitor que caráter novo sobrevém a uma coisa quando se verte sobre ela a qualidade de amada? O que sentimos quando amamos uma mulher, quando amamos a ciência, quando amamos a pátria? Antes de tudo aquilo que decidimos amar se nos apresenta como uma coisa imprescindível. O amado é, desde então, o que parece imprescindível. Imprescindível! Quer dizer, que não podemos viver sem ele, que não podemos admitir uma vida onde existimos e o amado, não – que o consideramos como uma parte de nós mesmos. Há, por conseguinte, no amor uma ampliação da individualidade que absorve outras coisas dentro desta, que as funde conosco. Tal ligação e compenetração nos faz internarmo-nos profundamente nas propriedades do amado. O vemos inteiro, se nos revela em todo o seu valor. Então advertimos que o amado é, por sua vez, parte de outra coisa, que necessita dela, que está ligado a ela.

Imprescindível para nós. Desse modo, o amor vai ligando coisa a coisa e tudo a nós, em firme estrutura essencial. Amor é um divino arquiteto que baixou no mundo, segundo Platão “afim de que tudo no universo viva em conexão” (Banquete 202e). A inconexão é o aniquilamento. O ódio que fabrica a inconexão, que isola e desliza, atomiza o orbe e pulveriza a individualidade”.

Pg. 30: O homem rende o máximo de sua capacidade quando adquire plena consciência de suas circunstâncias. Eu sou eu e minha circunstância, e se não a salvo, não salvo a mim. E também: “os amigos que vacilam em entrar na cozinha onde se encontra, grita Heráclito: “Entrai, entrai! Também aqui há deuses”.

Com aguda mirada já havia Nietzsche descoberto em certas atitudes morais formas e produtos do rancor. O rancor é uma emanação da consciência de inferioridade. É a supressão imaginária daqueles que não podemos destruir com nossas próprias forças. Leva em nossa fantasia aquele por quem sentimos rancor o lindo aspecto de um cadáver; o matamos e aniquilamos com a intenção. E logo, ao achá-lo na realidade firme e tranquilo, nos parece um morto indócil, mais forte que nossos poderes, cuja existência significa a burla personificada, o desdém vivo para a nossa débil condição contestando a realidade.

Pg. 33-34: os turcos, quando viajavam costumavam caracterizar os países por seu vício genuíno, e que usado dessa maneira, ele (Azorin) comporia a seguinte tabela: 1º) terra das modas: França; 2º) terra do mal-humor: Inglaterra; 3º) Terra dos antepassados: Espanha; 4º) Terra da Ostentação: Itália; 5º) terra dos títulos: Alemanha; 6º) terra dos senhores: Polônia.

Pg. 68-69: “quando Goethe viajou à Itália, fez algumas etapas da viagem na companhia de um capitão italiano. “Este capitão” – diz Goethe – “é o verdadeiro representante de muitos compatriotas seus. Eis aqui uma distinção que o caracteriza muito peculiarmente. Como eu frequentemente permanecesse silencioso e metidabundo, certa vez me disse: “Che pensa! Non deve mai pensar l’uomo, pensando s’invecchia! Non deve fermarsi l’uomo in uma sola cosa perché allora divien matto: bisogna aver mille cose, una confusione nella testa” “.

Pg. 77-78: “O reflexo é a forma mais sensível de existência virtual de uma coisa em outra. O sentido de uma coisa é a forma suprema de sua coexistência com as demais, é sua dimensão em profundidade. Não, não me basta ter a materialidade de uma coisa, necessito também conhecer o sentido dela, isto é, a sombra mística que sobre ela curte o resto do universo.

Perguntemo-nos pelo sentido das coisas, ou o que é o mesmo, façamos de cada coisa o centro virtual do mundo. Mas não é isso que faz o amor? Dizer de um objeto que o amamos, é dizer que é para nós o centro do universo, lugar onde se aninham os fios todos cuja trama é nossa vida, nosso mundo, não são expressões equivalentes? Ah, sem dúvida, sem dúvida. A doutrina é velha e venerável: Platão vê no Eros um ímpeto que leva a enlaçar as coisas entre si, é – diz, uma força unitiva e é a paixão da síntese. Por isso, em sua opinião das coisas, vai induzida pelo Eros. A meditação é exercício erótico. O conceito, rito amoroso”. Um pouco estranha parece, talvez, a aproximação da sensibilidade filosófica a esta inquietude muscular e este súbito ferver do sangue que experimentamos quando uma moça valente passa ao nosso lado ferindo o solo com seus saltos. Estranha e equívoca e perigosa, tanto para a filosofia como para nosso trato com a mulher. Mas, por acaso, tem razão Nietzsche quando nos envia seu grito: “vivei em perigo”.

E Mefistófeles, pg 125 do Fausto: “Viver em perigo é o certo”.

Pg. 116: “A apetência do realismo, característica do nosso tempo, não pode elevar-se ao pedestal de uma norma. Nós não queremos a ilusão da aparência, mas outras idades possuem outras predileções. Presumir que a espécie humana quis e quererá sempre o mesmo que nós seria uma vaidade.

Pg. 118: “Esta literatura de imaginação prolongará sobre a humanidade até o fim dos tempos o influxo benfeitor da épica, que foi sua mãe. Ela duplicará o universo, ela nos trará seguidamente novidades de um orbe deleitável, onde, se não continuam habitando os deuses de Homero, governam seus legítimos sucessores. Os deuses significam uma dinastia pela qual o impossível é possível. Onde eles reinam o normal não existe; do seu trono onímodo emana desordem. A constituição que furaram tem um só artigo; se permite a aventura”.

Pg. 127: “Contra o que supõe a ingenuidade de nossos almogávares eruditos, a tendência realista é a que necessita mais de justificação e explicação, é o exemplum crucis da estética”.

Pg. 152: “A fecundidade do que costuma chamar-se patriotismo no pensamento espanhol se manifesta nos fatos espanhóis positivamente grandes que não tem sido suficientemente estudados. O entusiasmo se gasta em alaridos estéreis daquilo que não é louvável nem se pode empregar com energia suficiente ali onde faz mais falta”.

Flaubert: “Ah! Ce qui manque à La societe moderne ce n’est pás um Christ, ni un Washington, ni un Socrate, ni un Voltaire; c’est un Aristophane”. Correspondence II, 159, citado por JOYG pg 153.

Pg. 154: A realidade é de um gênio tão feroz que não tolera o ideal nem quando ela mesma é idealizada.

Pg. 162: Ortega se engana quando diz: “é um erro representar-se a novela – e me refiro sobretudo a moderna – como um orbe infinito do qual pode extrair-se sempre novas formas... Existe na novela um número definido de temas possíveis”. E mais adiante: “é praticamente impossível achar-se novos temas. Eis aqui o primeiro fato da enorme dificuldade objetiva e não pessoal que supõe compor uma novela aceitável na presente altitude dos tempos... Não sem razão se chama o gênero de “novela”, isto é, “novidade”.

“O imperativo da novela é a autópsia, isto é, nada de referência ao que a personagem é, mas sim fazer o leitor vê-lo com seus próprios olhos. Toda a referência, relação, narração não faz mais que sublinhar a ausência do que se refere, vela e narra”.

Pg. 188: “Pois bem, eu diria que o interesse dramático é uma necessidade psicológica da novela, nada mais, mas claro está, nada menos. De ordinário, não se pensa assim. Costuma acreditar-se que é a trama sugestiva um dos grandes fatores estéticos da obra, e consequentemente se pedirá a maior quantidade dela possível. Eu creio inversamente, que sendo a ação um elemento mecânico, é esteticamente peso morto, e portanto, deve reduzir-se ao mínimo.... Se trata nada menos que do antagonismo ou mutualidade entre ação e contemplação.

Pg. 199: “Por isso, o homem de ação costuma ser um péssimo pensador, e o ideal do sábio, por exemplo, no estoicismo, faz deste um ser desprendido de todas as coisas, inativo, com alma de lagoa imóvel que reflete impassível os céus transitórios”.

Pg. 207: “A novela não é um gênero rápido, ágil, alado. Deveríamos ter entendido como um sinal orientador o fato de que todas as grandes novelas que hoje preferimos são, de um certo ponto de vista, livros um pouco pesados. O poeta pode sair a andar com sua lira embaixo do braço, mas o novelista necessita mobilizar-se com um enorme fardo (impedimento), como os circos peregrinos e os povos emigrantes. Leva nas costas todos os acessórios de um mundo.

Pg. 210: “Quem sabe se os Estados de tipo moderno só são possíveis em etapas de grande torpeza psicológica dos cidadãos?”


Ortega y Gasset — Estudios Sobre el Amor

Pg. 22: As vezes padecemos de uma vital decadência que não procede de enfermidades em nosso corpo nem em nossa alma, mas de má higiene de ideias.

Pg. 28: “As excelências varonis – o talento científico ou artístico, a destreza política e financeira, a heroicidade moral – são de certa maneira extrínsecas à pessoa e por assim dizer instrumentais. O talento consiste numa atitude para criar certos produtos socialmente úteis – a ciência, a arte, a riqueza, a ordem pública. Mas o que propriamente estimamos são os produtos, e só um reflexo do valor que o atribuímos se projeta sobre os dotes necessários para produzi-los. Não é o poeta, mas sua poesia que nos interessa, não é o político, mas sua política. Esse caráter extrínseco dos talentos se faz patente e pode dar-se frequentemente no homem ao lado dos mais graves defeitos pessoais”.

Pg. 178:"Note-se que o decisivo na história de um povo é o homem médio. Do que ele seja depende o tom do corpo nacional. Com isso, não quero negar aos indivíduos egrégios, as figuras excelsas, uma intervenção poderosa nos destinos de uma raça. Sem eles não haverá nada que valha a pena. Mas, qualquer que seja sua excelsitude e perfeição, não atuarão historicamente senão na medida que seu exemplo e influxo impregnem o homem médio. Que vamos fazer! A história é sem remissão, o reino do medíocre. A humanidade só tem de maiúsculo o H com que a decoramos tipograficamente. A genialidade maior se estatela contra força ilimitada do vulgar. O planeta parece estar fabricado para que o homem médio sempre reine. Por isso é importante que o nível médio seja o mais elevado possível. E o que fez magnífico os povos não é primeiramente seus grandes homens, mas as alturas dos inumeráveis medíocres. Está claro que ao meu juízo o nível médio não se elevará nunca sem a existência de exemplares superiores, modelos que atraiam ao alto a inércia das multidões. Portanto, a intervenção do grande homem é secundária e indireta. Não são eles a realidade histórica e pode ocorrer que o povo tenha indivíduos geniais sem que por isso a nação valha historicamente mais. Isso acontece sempre que a massa é indócil a esses exemplares, não os seguem, não os aperfeiçoa.

É curioso que os historiadores até há pouco se ocupassem exclusivamente do extraordinário, dos fatos surpreendentes e não advertissem que tudo isso possui somente valor anedótico, ou ao sumo, parcial, e que a realidade em história é precisamente o cotidiano, oceano imenso em que sua vasta dimensão inunda todo insólito e sobressalente".


Nacos:
Espasmódica voluptuosidade.
Vi com esses olhos que a terra há de comer.
+++++++++++
Dies ira, dies illa
Salvet saeculum em favilla

Dias de ira, dias que
Espalharão o século em cinzas.
+++++++++++
Mefistófeles: “É um velho ditado de que de grandes mundos fizemos um pequeno”. [Metáfora para o Brasil].
Estudante: "Mas deve haver alguma ideia por trás de cada palavra".
Mefistófeles: "Certamente. Mas não se atormente tanto. Justamente onde faltam ideias, surge a palavra".
Palavras são esplêndidas armas para lutar, com palavras pode se preparar um sistema;
Palavras são ótimas para se ter fé – pode-se tirar tudo de uma delas.


Bertrand Russell — Essays on Skepticism

Pag 3: “Os povos que são vigorosos e brutais seguidamente acham a guerra apreciável, estipulando que é uma guerra vitoriosa e que não há muita interferência com a pilhagem e o estupro”.

Pg. 6: “Quando um homem tortura a si mesmo, ele sente que isso dá-lhe o direito de torturar os outros, e fica inclinado a aceitar qualquer sistema de dogmas através do qual esse dogma é fortificado (enfatizado).

Pg. 71: “Se como a maioria do gênero humano, você tem convicções apaixonadas em muitos assuntos, existem formas em que você pode ficar consciente de seus próprios preconceitos. Se uma opinião contrária a sua própria torna você zangado, isto é um sinal que você está subconscientemente alerta de não ter boa razão de pensar como pensa. Se alguém sustenta que dois e dois são cinco, ou que a Islândia é no Equador, você sente piedade ao invés de raiva, a menos que você conheça tão pouco de aritmética e geografia que estas opiniões perturbam suas próprias convicções contrárias. As mais selvagens controvérsias são aquelas sobre assuntos em que não se possui nenhuma evidência. A perseguição foi usada em teologia, não em aritmética, porque em aritmética há conhecimento, enquanto em teologia há somente opinião. Sempre que você se encontra ficando raivoso sobre uma diferença de opinião, esteja em guarda: você provavelmente encontrará, no exame, investigação que sua crença estará indo além do que a evidência garante.

Uma boa maneira de livrar-se de certas espécies de dogmatismo é tornar-se informado das opiniões mantidas em círculos sociais diferentes dos seus.

Pg. 75: Platão, na República, enfatiza que os pontos de vista carinhosos sobre o outro mundo deveriam ser reforçados pelo Estado, não porque fossem verdadeiros, mas para fazer os soldados mais desejosos de morrerem nas batalhas.

Pg. 78: O medo coletivo estimula o instinto de rebanho, e tende a produzir ferocidade naqueles que não são vistos como membros do rebanho. Assim foi na Revolução Francesa quando o medo dos exércitos estrangeiros produziu o reinado do terror. E é para se atemorizar que os nazistas, assim que a derrota aproximou-se, aumentaram a intensidade de exterminação dos judeus. O medo gera impulsos de crueldade, e entretanto, promove crenças supersticiosas para justificar a crueldade. Nenhum homem, multidão ou nação pode ser confiada a agir humanamente ou pensar sanamente sob a influência de um grande medo. E por essa razão os poltrões são mais inclinados a crueldade que os homens bravos, e também mais inclinados a superstição. Quando digo isso, estou pensando em homens que são bravos em todos aspectos, não somente em face da morte. Muitos homens devem ter a coragem de morrer galantemente, mas não terão coragem de dizer, ou mesmo pensar, que a causa para a qual eles foram requisitados a morrer não tem nenhum valor.

Pg. 82: sobre sua desqualificação para lecionar em universidades americanas.


Oswald Spengler — A Decadência do Ocidente

Pag 11: ‘Segundo Momnsen “os historiadores romanos, especialmente Tacitus, eram homens que diziam o que era meritório omitir e omitiam o que era essencial dizer” ‘ [Isto é maluquice, pois como diferenciar o meritório do essencial?].

Pg. 33: Foi no conceito do dinheiro como uma magnitude abstrata inteiramente desconectada da noção de produtos da terra e dos valores primitivos que os Romanos tiveram supremacia sobre os Gregos. Desde então um alto ideal de vida tornou-se principalmente uma questão de dinheiro. Ao contrário do estoicismo grego de Crisipo, o estoicismo romano de Catão e Sêneca pressupõe uma renda privada, e, ao contrário do século XVIII, o sentimento social e ético do século XX, se for levado em consideração um nível mais alto que a profissional (e lucrativa) agitação, é matéria de milionários.

Pg. 34: Qual é a marca total da política da civilização hoje, em contraste com a política da cultura de ontem? É, para a retórica clássica, e para o jornalismo do Ocidente, ambos servindo à abstração que representa o poder do Ocidente – o dinheiro.

É o espírito do dinheiro que penetra irremediavelmente as formas históricas da existência das pessoas.

Pag. 47: “As formas da arte ligam-se as formas da guerra e da Política dos Estados. Profundos aspectos são revelados entre os aspectos matemáticos e políticos da mesma cultura, entre concepções religiosas e técnicas, entre matemática, música e escultura, entre economia e formas cognitivas”. [Economia e formas cognitivas? Estranho].

Ortega: Se vai a arte precisamente porque se sabe que ela é falsa. (Desumanização da Arte).

Schlegels – proclamou a ironia como a mais alta categoria estética.


Fragmentos para a novela Opios, Topiarios e Rodopios.
Panacas abrutalhados – cocurutos
Leonardo: cada pintor pinta a si mesmo.
Buona regola, miglior ordine, retta misura, disegno perfetto e grazia divina, são as regras de Leonardo para a pintura.
Pico della Mirandola precedendo o existencialismo disse que o homem é entre todos os seres o único cuja existência precede a essência.
Homo artifex - Filosofo bestiale – sotilezze da riso – propósito mentale – imprese – concetto – tantecose – spiritelli (amor transportado por pequenos espíritos migratórios).
Nobilitas – propriedades mágicas ou proféticas da alma.
Cosquilhento – cosquilhoso.
A partida do espírito imaginário era chamada de êxtase.
Sinderesi – senso moral, o ponto mais alto do espírito afastado do corpo em si mesmo, num êxtase que o faz divino.
Par excellence – mezzoscuro – stupore – sospino
Dolce stil nuovo

Diego para a pintora(Cavalcanti):
        Veggio neglio occhi della Donna mia
        Un lume pien di spiriti d’amore.

A pintora para Diego (Dante):
        De li occhi suoi, como ch’ella li mova
        Escono spiriti d’amore inflammati
.
pimpolhos


Damaso Alonso — Gongora y el Polifemo ‐ Editorial Gredos 1967

Bicoca – coisa de pouco valor na linguagem cervantina.
O comércio idiomático
Gongora: “Honra me há causado haverme escuro a los ignorantes, que esa es la distinción de los hombres doctos”.
Uma visão mais justa e repousada dos termos
Vol 2. Pg. 36:
        “las venas com poca sangre,
        Los ojos com mucha noche”.
Pg. 79:
        “Tratem otros del gobierno
        Del mundo y sus monarquias,
        Mientras gobiernan mis dias
        Mantequillas e pan tierno;
        Y lãs mañanas de invierno
        Naranjada y aguardiente
        Y ríase la gente.


Pg. 81:
        Porque en una aldea
        Un pobre mancebo
        Hurtó solo un huevo,
        Al sol bambolea,
        Y outro se pasea
        Con cien mil delitos
        Cuando pitos, flantas
        Cuando flantas, pitos.

Pg. 91:
        Si el pobre a sua mujer bella
        Le da licencia que vaya
        A pedir sobre la saya,
        Y le dan debajo della,
        Que gruñe? Qué se querella
        Que se burlan de el los ecos?
        Y qué teme em años secos
        Si el necio a su casa lleva
        Quien en años secos llueva
        Haja, pues, em paz, su trigo:
        Y digan que yo le digo

Pg. 103:
        Cruzados hacen cruzados,
        Escudos pintan escudos,
        Y tahures muy desnudos
        Com dados ganan condados;
        Ducados dejan ducados,
        Y coronas majestad;
        verdad!


Nacos:
Porta mea tantum rex – só abro a porta ao rei
Pendanga – coisa que se usa para diversos fins. Ocupação acessória. (usei para corrupção)
Penates – Deuses pagãos. A casa paterna, a família, o lar.
+++++++++
Do livro Form and Meaning: pag. 102:
“Continual farce ! My innocence would make me cry. Life is a farce played by all”. Palavras de Rimbaud em Uma Estação no Inferno.
9/11/84 [finalmente apareceu uma data]
Existe a memória. Memórias menos prodigiosas e mais prodigiosas. Mas a literatura não é a memória, ao contrário, é invenção da memória. Por isso, ela nunca é presente.
Enxacoco – que fala mal uma língua estrangeira, entremeando nela palavras da sua. Exótico, estranho: linguagem enxacoca.
Membeca – brando, mole, tenro.
Ribombância
O Leito de Procusto


Guimarães Rosa — Tutameia – Terceiras Histórias

Vocabulário e frases típicas:
Arrulhar –
Convidatividade –
Tinha vergonha de frente e de perfil.
Torceu mais o espírito
Era infinitamente maio –
E as aldeias são as alheias vigilâncias
Todo abismo é navegável a barquinho de papel
Esperar é reconhecer incompleto
O trágico não vem a conta-gotas
Em lance de tão vermelha e preta amplitude
O tempo é engenhoso
Num abrir e não fechar de ouvidos
Sempre vem imprevisível o abominoso?
Suas lágrimas corriam atrás dela, como formiguinhas brancas.
No decorrer e comenos
Falsas lérias escabrosas
Remendados testemunhos
O real e válido, na árvore, é a reta que vai para cima
Pássaros cantavam feito sabiás, vai ver sabiás mesmos.
Caidiças
Tonteava a velocidade das nuvens, para oeste ou leste.
Na regência do sol
Lumaréu – calafriagem – flausina – fulo de fulo – arrenego – pequenidades ... infinilhões
Em fel e losna na língua
Pontintim – Frechado – suando produzidamente
E houve a rebordosa
Caraminholava:
“Perpisca-nos a inércia que soneja em cada canto do espírito...”
o gruziar de um peru
ludopédio – futebol
mistilíneo – pg. 103 -
“de se temer um destranque”
“todo subsentir dá contágio, cada presença é um perigo?”
arejo – desalmoso – escarrancho
Tinha a cara de quem não suspirou circunsequentes -
Nunca entendi o bocejo e o pôr-do-sol
Como são curtos os séculos, menos este!
“Até a pública luz da manhã – próprio abalroo e espanto.
Acabrunhado – coincidências de ordem tão estapafa?
Espírito sem bicarbonato
estrebuchado – porpuxos
A boiada cruzava um aniquilo de paragens,
acatrimar-se – pg. 162
o surgibufe (do boi) – chucrar – A linguada se inçando – trabuqueros


Kropotkin — Mutual Aid

Pg. 13: Neste imenso reino animal que engloba mais de mil espécies [de formigas], e são tão numerosas que os Brasileiros fingem que o Brasil pertence às formigas, não aos homens, a competição entre elementos do mesmo ninho, ou colônia, não existe.

Pg. 22: Os urubus do Brasil são, tanto ou até mais sociáveis que as gralhas.

Procurar Aristippus e os cínicos gregos. Zeno e os estoicos.

Max Stirner (JohannKasper Schmidt)

The Ego and his Own – 1845

Pg. 167: O maior obstáculo para a manutenção de um certo nível moral nas nossas presentes sociedades assenta-se na ausência de igualdade social. Sem igualdade real, o senso de justiça não pode ser universalmente desenvolvido, porque justiça implica o reconhecimento da igualdade. [Ver acima a objeção de Ortega à ideia de igualdade].


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